Complexo de Vira-lata Não Poupa nem Ex-Presidente

Notícia da Folha de S. Paulo de hoje, com direito a chamada na primeira página,  informa que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso teria sugerido  como lema do  seu partido, PSDB,  o slogan de Obama (Yes, we can) adaptado para “Yes, we care” .

Se for  mesmo verdade (já que não aparece entre aspas a citação)  que um ex-presidente do Brasil, intelectual de reconhecido prestígio em todo o mundo,  tenha sugerido  slogan em Inglês para seu partido político, é  sinal muito forte  de que o Complexo de Vira-lata é mesmo implacável.

Em tempo 1: Para uma ínfimíssima minoria dos mais de 190.000.000 de brasileiros, no máximo 50 pessoas (só mesmo fazendo ironia barata),  a tradução da pérola “yes, we care”, é algo como  sim, nós nos preocupamos.

Em tempo2: Complexo de Vira-lata – do qual falava Nélson Rodrigues, é  ” a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do mundo (…) o brasileiro é um narciso às avessas, que cospe na própria imagem.”

Mais algumas manifestações explícitas de Complexo de Vira-lata (CVL, para facilitar).   Há CVL na Ecologia, moda, negócios, entre milionários na praia, entre milionários no Campo, no Shopping,  Assolando Inteletuais e até duas honrosas exceções: Hering e Computadores  Positivo.  Clique aqui .



1 pensou em “Complexo de Vira-lata Não Poupa nem Ex-Presidente

  1. Mayr, vou brincar de escrever. Nelson Rodrigues era incrível, leia mais sobre o complexo de vira-lata que ele diagnosticou, (como um psiquiatra/analista de nossa sociedade classe média, nos contos “A vida como ela é”), e com a qual gostava de zombar:

    “Ou expulsamos de nós a alma da derrota ou nem vale a pena competir mais. Com uma inferioridade assim abjeta, ninguém consegue nem atravessar a rua, sob pena de ser atropelado por uma carrocinha de Chica-Bon.” (artigo na Manchete Esportiva, 19/5/1956 – do livro “A pátria em chuteiras – Companhia das Letras).

    Muitas vezes o cronista fazia esforço para levantar nossa auto-estima e usava e abusava da imagem do futebol:

    “Olhem Pelé, examinem suas fotografias e caiam das nuvens. É, de fato, um menino, um garoto. Se quisesse entrar num filme da Brigitte Bardot, seria barrado, seria enxotado. Mas reparem – é um gênio indubitável. Digo e repito – gênio. Pelé podia virar-se para Michelangelo, Homero ou Dante e cumprimentá-los, com intima efusão: “Como vai, colega?”. (idem, crônica de janeiro/1959 – edição especial da Manchete Esportiva).

    Esse defeito de caráter ataca e é celebrado principalmente a classe média brasileira e as pessoas que orbitam a sua volta, nas reuniões sociais onde se busca de “estatus”. Nesse ambiente onde um suspeita do outro, mas na qual gostam de comparecer e mostrar aos seus pares as suas conquistas materiais (carros, jóias, roupas, etc). Também é onde gastam um dinheiro que lhes faz falta para se confraternizarem com pessoas das quais não gostam.

    O povo, o povo mesmo, esse que anda de busão, que trabalha, de mãos calejadas, roupas sujas da labuta, que mata um leão por dia para alimentar a família e manter a própria dignidade, ama, ama muito o Brasil e, nem um pouquinho se sente inferiorizado. Longe disso, este povo ama o seu povo e a cultura brasileira. Ama tudo o que é do Brasil, embora ele, governado por outros interesses, muitas vezes lhe faça mal. Mas é essa classe laboriosa que constrói a pátria, a cidadania e luta pelos seus direitos.

    A classe que sofre de CVL, (formada em parte por pessoas que acham que um diploma universitário é suficiente para colocá-los no Monte Olimpo, mas não fazem esforço para galgá-lo – “cacête, que língua a nossa! Galgá-lo !!”), conhece o mundo através de pacotes turísticos de sete dias pagas em doze prestações, passa a vida a olhar aquele espelho e a se chamar entre si de “excelência”, enojada de nossas coisas.

    Pois bem, se já não me perdi no diálogo, vamos em frente. CVL é coisa antiga. Vem lá da época colonial. “Ajunte-se a isto a natural desafeição pela terra, fácil de compreender se nos transportarmos às condições dos primeiros colonos… não havia pendor a meter mãos destinadas aos vindouros; tratava-se de ganhar fortuna o mais depressa para ir desfrutá-la no além-mar. … Desafeição igual à sentida pela terra nutriam entre si os diversos componentes da população” (“Capítulos da Historia Colonial” – Capistrano de Abreu – série Pensamento Brasileiro – Editora Itatiaia). Chega de citação, né !, tá ficando chato.

    Daí que isso vem há tempo; e, de tempo em tempo aparece coisa nova pra aborrecer quem ama de fato o Brasil e que trabalha por ele e quer deixar para os filhos e netos algo melhor e mais igualitário do que recebemos.

    Agora, encasquetaram com Lula e seu modo de falar. Como se não fosse normal que um presidente que veio do povo falasse a língua do povo. Mas essa mesma classe, (pseudo erudita, que ama o poeta Manuel Bandeira e lamenta que ele não escreva em francês), esqueceram de ler o seu poema: “A vida não me chegava pelos jornais nem/ pelos livros./ Vinha pela boca do povo, na língua errada/ do povo./ Língua certa do povo./ Porque ele é que fala gostoso o português/ do Brasil./ Ao passo que nós/ o que fazemos/ é macaquear/ a sintaxe lusíana.”

    Também não faz muito, a moeda do real copiou o dólar americano “In god we trust”. No Real colocaram “Deus seja louvado”. Contudo, nossa geração, que passou pelas diversas crises econômicas e sofreu os diversos planos econômicos queriamos mesmo que contivesse algo como “Is what God wants”, ou “Seja o que Deus quiser”.

    Não vai aqui nenhuma critica à Deus e aos religiosos. Longe disso. Porque a este respeito, é nosso querido Nelson Rodrigues quem encerra o assunto: “O cara que não acredita em Deus merece passar a vida amarrado a uma perna de mesa, andar de gatinhas e condenado a beber leite numa cuia de queijo Palmira”. Um abraço.

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